domingo, 16 de novembro de 2008

Crise


De repente, ficou escuro e me vi perdido. Eu, que achava que sabia o que era estar perdido de verdade, não perdia, desta vez, por esperar. O que já era labirinto permaneceu labirinto, sem saída em vista, sem buraquinhos na parede onde pudesse espiar prá fora. Só que ao labirinto juntou-se uma perda de senso, de equilíbrio, de rota. Com o perdão do trocadilho, se andar por este labirinto nunca fora fácil, com uma crise de labirintite, então, tornara-se impossível. Insuportavelmente desesperador.

Tudo ia muito bem, embora não estivesse tudo, de verdade, muito bem. Respirava, nos ares, harmonia, mas por dentro não a sentia penetrando nos pulmões, chegando ao sangue, à mente, ao coração. Minha vida caminhava em Pax Armada, com algum gozo de justiça, mas pouco de liberdade. Sentia que era tarde para tudo que, por motivos vários, deixara de fazer em meu passado. Sentia precisão enorme de mudar muitas coisas, além da superfície, a fim de impedir que tais lacunas se fizessem eternas. Não raras vezes, ensaiei na cabeça o discurso, a atitude, a firmeza. Inspirado em personagens, quis, eu também, virar personagem de histórias de novelas, filmes, músicas, em que tudo dá certo e se supera. Num lampejo fugaz, julguei até que não seria árduo - nunca fora, antes, para mim.

Estava errado. Em xeque, tudo. Um fiapo de vida não escapou do questionamento. Caindo na real, tive a sensação mais dolorosa da minha vida. Eu, que achava que sofrer era chorar uma paixão longe dos olhos, ou não ter o ouvido certo que entendesse o que queriam minhas angústias, deparei-me com algo novo e terrível, e petrifiquei. Senti dores físicas ora reais, ora imaginárias, prostrei-me na cama, achei que o fim estava próximo. Perdi o encanto de enxergar razão nas coisas, até as mais importantes para mim. Recebi, na sala de visitas, a presença da loucura, da morte, da esperança, da solidão, do êxtase, da depressão, da vontade, do medo, da finitude, todas elas brigando e brindando entre si, deixando-me sem entender aonde chegariam nesta dança de paradoxos. Oscilando entre extremos perigosos, fui da alegria ao "nada importa" em questão de dias, agravado o fato pela minha incompreensão e meu temor em que isto se estendesse sem prazo de terminar.

Ainda se estende. Neste instante, não sei quem sou nem o que quero. Tenho uma idéia de que tudo não passe de uma fase ruim, natural neste ciclo de altos e baixos da vida. Detrás da balbúrdia subjetiva, há um fato que me trouxe a este desgaste tenebroso. Um, não: muitos fatos. Grande parte, inclusive, léguas distante do que a maioria pense. E, se eles me trouxeram até aqui, é bem provável que me levem de volta aonde eu estava. Tenho indícios fortes que apontam para isso.

Neste instante, no entanto, tudo continua escuro. Tudo continua estranho. Tudo, uma viagem fora da órbita em que eu estava acostumado a girar. Sem noção do que é viver sem gravidade, estou meio perdido num universo sem estrelas, à procura de algumas que, quem sabe, me orientem aonde ir. Preciso delas, mas nunca acertei seu nome correto, tampouco sua exata posição. Jamais imaginei que a liberdade custasse tão caro, nem que houvesse tantos buracos-negros sugando-me as energias, querendo-me levar a um passeio pelo nada. Sem enxergar, devo dizer que é difícil distinguir as trilhas estelares destes buracos-negros. Ainda não descobri se vale mais ficar parado e esperar que a luz retorne (ou então que a equipe de resgate me encontre) ou errar pelo escuro até acertar. Até achar o brilho desta estrela ao fim do túnel...

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