As fontes não
são nada filosóficas: séries de comédia.
Em uma delas,
a personagem diz: "eu não esperava nada, não tinha ilusões. Mas isso não
significa que ele não pudesse ter o mínimo de educação, de cortesia."
Em outra, a
personagem adverte: "você não pode dizer aos outros o que eles tem que sentir.
Simplesmente não pode".
Trata-se de
duas frases bastante simbólicas. Bastante reveladoras, eu diria. Em certa
dimensão, senhas para uma realidade que enxergo cada vez com mais nitidez,
talvez porque o tempo passe; talvez, ironicamente, porque não passe.
A falta de
educação beira os limites da hecatombe. É incrível como grassa, como se insinua
na prática cotidiana de maneira tal que parece irreversível. Se está assim
entre pessoas que se conhecem, que guardam relação próxima, como não estará
entre estranhos? Uma pergunta retórica, claro, mas de resposta patente à mais
superficial das observações. Basta pôr um pé fora de casa. Basta acessar esta
rede.
Os
imperativos, igualmente, difundem-se à velocidade da luz. Já não se quer mais
determinar o que você tem que pensar, o que pode ou não dizer. Pretende-se
reinar no domínio do sentimento. O inalienável direito ao inconformismo dá
lugar a uma patrulha incessante de supostos deveres. Sacrifica-se a variedade,
a diferença, os matizes, tudo em nome de discursos que, em vez de alavancar,
atravancam o verdadeiro progresso. Choca a profunda tendência à homogeneidade.
Espanta a compulsão por posições políticas rígidas, pautadas em slogans, não em
ideias; em marketing, não em reflexão; em reprodução, não em elaboração
autônoma. É assim na imprensa, assim nas universidades, nos movimentos sociais,
nos partidos. Rarefeito o ar dos que se arriscam a questionar, ainda que
modestamente, este maniqueísmo em voga. À primeira trombeta, ficam sozinhos na poeira dos prófugos,
apontados e marcados por aqueles que se entrincheiram. Não servem, não valem.
Infelizmente, sentem. Soberanamente sentem, amam, sofrem.
Se vamos falar
de mídia, sejamos imparciais. Qual órgão é, verdadeiramente, independente?
Qual deles não se sustenta pelo dinheiro das propagandas de algum governo,
sobretudo o federal? Qual deles não se pauta pela agenda partidária? Qual deles
não fala aquilo que seu público deseja ouvir? Em última instância, qual deles
não faz o necessário para manter seus ganhos, às vezes sua sobrevivência? Neste
outubro de 2014, não identifico nenhum. Nenhum. Sei disso porque o ouvi da boca
de um importante âncora da televisão, mas nem precisaria. A exceção, se existe,
não tem ressonância. Ou seja, não é uma revista, um jornal, um canal. É a imprensa. Venal talvez, mas razoavelmente abrangente na soma dos repertórios, o que já é alguma coisa.
Se vamos falar
de visão crítica, sejamos críticos dela própria. Na sala de aula, todos os
alunos pontuam a importância da análise crítica, da observação crítica, da
postura crítica perante documentos, interpretações, teorias e afins. Temos que
ser críticos. Temos que. E a crítica vai para o espaço no "temos
que", prisioneira de mais este clichê, o qual, aberta a porta da sala,
grande parte parece esquecer, parece voltar aos gritos de guerra, à catarse das
torcidas uniformizadas, aos olhos arregalados e desconexos palavrões diante da
lente da câmera.
Por que estou
dizendo isso, não sei precisar. Quando se é vítima de atitudes mesquinhas,
quando se é confrontado com a dimensão de sua absoluta falta de importância
perante aqueles por quem se tem sentimento, seja de amizade, consideração,
admiração ou um pouco de cada, muita coisa vem à tona. O olhar fica mais aguçado, a
pele fica mais sensível para as pequenas verdades particulares que, por
conveniência ou paz de alma, mantem-se em latência. Uso as palavras porque
neutras a quem não se interessa. Uso este espaço porque não alcanço o sideral.
E assim é por
ora, sem ilusões, sem intenções, com sinceridade.