sexta-feira, 17 de junho de 2016

Perguntas


Cada post realizado, salvo outros três, em média. Não sei se é algo bom ou ruim. Fico pensando depois: quem vai ler tudo isso? Quem vai se interessar? Qual sua importância, a não ser para quem redigiu, ainda mais não sendo eu um escritor profissional?

Muitas vezes penso na minha descendência, entre filhos futuros e sobrinhas presentes. Não no sentido de deixar qualquer legado, porque não teria tal pretensão, mas no sentido de que soubessem quem eu sou, quem eu fui, quanto amei. Algo de que me ressinto em relação a meus avós falecidos, a outros parentes importantes dos quais só tenho os testemunhos de quem com eles conviveu. São narrativas que fazem falta, que fariam companhia em horas de paz ou desencontro.

Neste aspecto (em qual não?), a vida é surpreendente. Acostumados à superfície, mal tangenciamos a experiência íntima dos que nos cercam. As pessoas passam e o que fica delas? O que sabemos de suas aspirações, de seus temores? Acabamos no pântano comum das impressões, das imagens públicas, dos apelidos, dos traços físicos. Daquilo que seria suficiente, não fossem os álbuns, os chaveiros, as caixinhas de lembranças no fundo do guarda-roupas, abertas, quando muito, de ano em ano, quase como um ritual. Não fossem as conversas em silêncio, as mudanças adiadas, o choro das permanentes despedidas de si mesmo.

Cada vez que me dou conta de haver deixado de lado uma oportunidade de entender melhor alguém, rasga-se-me uma fibra. Porque sei que ocasiões assim não se repetem. Como sei que os olhos correm sem pousar a tela, as ruas, as vitrines, os rostos, porque este é o ritmo e a regra. Não dá para ser próximo de uma multidão, evidentemente, mas e quando a distância se aprofunda com quem está do lado? Quem não sai do pensamento? Quem estende a mão? Quem o tempo já levou?

São perguntas que me faço nesta idade, ciente de que as respostas não virão nas próximas. Talvez não existam. Talvez, existindo, sejam ferozes demais, difíceis além.

Amém!

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Discurso

 
Às vezes a gente começa a semana como quem termina um ano. Um ano não, um ano-luz.
 
O que é natural no ritmo dos enganos, pois enquanto um corpo resiste a sair do cobertor, uma alma não resistiu e desertou do corpo congelado lá na rua, doente do frio, da esquerda, da direita, da opinião e seu oposto, do porre de algum desgosto. Uma alma que, tudo indica, serve melhor à sociedade e seus cabeças agora que é penada.
 
O que não é natural, pois enquanto juram que você é feliz, na verdade o trem está a um palmo de descarrilar, e enquanto a face parece abatida, o peito está a exultar, e enquanto o mundo pensa entender, na verdade ninguém sabe é nada.
 
E porque, abracadabra, enquanto tudo que lhe falta, tudo quanto anseia, é ser o mais simples dos homens, enrola-se a língua, contorcem-se os membros, secretam-se gosmas, triunfa nos campos o epilético vulto do discurso.
 

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Segunda-feira

 
Todos os planos de grandes mudanças que fiz para começar nas segundas-feiras falharam brilhantemente. Os poucos que, de fato, se iniciaram, tiveram uma vida média de 3 dias, aproximadamente, prazo a partir do qual se espreguiçaram e voltaram ao sono profundo de onde surgiram.

Mesmo com tantos dados pessimistas em mãos, quase todo domingo à noite, não tem jeito: já começa de novo a tentação. Um impulso que corre a coluna, cora o rosto, faz esfregar as mãos. Vou fazer isso, vou fazer aquilo, nada será como dantes. Ajustes, reformas, revoluções. Admirável mundo novo.

E a segunda chega, lentamente, com seus passinhos irônicos de dança, o sorriso irrevogável, as vértebras de pedra, a marreta solene a derrubar, insensível, os princípios da construção.

Diante de tal panorama, alguém poderia questionar, com toda a justiça e perspicácia: por que insistir no que a própria estatística já provou consistir em erro? Sinceramente, não sei responder.

O que sei, com alguma reserva de convicção, é que, apesar de tudo, um esforço nunca é em vão. Por mínimos os frutos palpáveis, cada ideia de mudança já compreende uma mudança. Cada plano que consegue ir adiante, ainda que por poucas horas, já traduz uma iniciativa. Consequentemente, cada domingo de tentação é um reconhecimento implícito de que há o que fazer e como fazer, o que, por si só, constitui uma celebração das potencialidades da vida.

Deu resultado? Que bom! Não deu resultado? Que bom também! A incerteza é uma das poucas provas do livre arbítrio, um dos muitos mistérios que atiçam a inteligência e tocam o coração.

Aliás, tocou!